sábado, 18 de abril de 2015

os doces das 18 hr



Enquanto enterrava o cachorro morto da vizinha amiga o sol se punha lento e laranja, feito os do litoral que ofuscavam a visão nos meus olhos cansados. Observei o mato baixo ao meu redor, as falhas no solo que não eram para jogar bolas de gude, a terra era vermelha, manchava nossas mãos e pés pequeninos. Não sentia tristeza, na verdade havia uma indiferença muda que diante dela, e da morte, fingia se importar. Sobrava o respeito por ambos, a vizinha e a morte do cachorro quase feto. Naquela altura já com dez anos, tinha consciência do que era morrer.
Não me doía a cena.
Ele apareceu, magro e negro. Não tirou o capacete da cabeça que deixava revelado somente os olhos de uma cor qualquer que não me fiz interessada. Chamou-me Não respeitando o ritual fúnebre. Havia na voz um tom de prazer. Era sexuado.
Aproximei-me. Nos aproximamos. Enquanto olhando nos olhos do nada e reparando na sua moto verde musgo não percebi correr nele o sangue do gozo. Veio então a pergunta inocente sobre o nome da rua. E enquanto abria a boca ele abria o botão seguido do zíper da calça. Expox seu pau. Não reconheci. Tão pouco sabia o que era. Percebi então que me causou nojo somente. Tocou nele enquanto me olhava. Bloqueei como um cego. Dei passos para trás como quem por instinto ou intuição, percebe o perigo. Gritei a vizinha. Corri. Corremos. Escorreu nele o líquido da busca asquerosa da inocência ainda não perdida. Talvez os ossos ainda estejam lá. Caixa de papelão apodrece rápido mas ossos não.
Recolhi. Naquele quintal meu observei sentada no balanço que meu pai havia feito a grama bem cortada o cheiro de roupa limpa no varal próximo. Pra lá e pra cá. Meu pai cruzou o portão, trouxe balas. Sempre nos trazia balas.